sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Histórias de vida

Nenhum lugar do mundo é tão estranho como a sala de espera do bloco cirúrgico de um hospital. Falo isso, porque nessa sexta-feira, estive por algumas horas, nesse local para retirar apenas um pequeno cisto benigno localizado atrás da orelha. Mesmo não sendo no rosto, fiz o procedimento com um cirurgião plástico, que é para não ficar com cicatriz. Pode parecer bobagem esta preocupação, visto que não apareceria, mas sou uma mulher detalhista. Foi tudo muito rápido. Entre anestesia local e três pontinhos, deve ter durado trinta minutos e saí feliz da vida como se tivesse cumprido a minha maior missão dos últimos tempos, isso porque tenho horror a coisas por fazer e essa foi uma das que fui adiando em função da campanha eleitoral. Aliás, estou adorando essa fase de ter tempo para cuidar de mim e quero aproveitá-la ao máximo, pois sei que ela tem dias contados. É que recebi uma proposta maravilhosa de trabalho, mas ainda não posso contar, falta ajustar alguns detalhes, então, vocês terão que aguardar um pouquinho e administrar a curiosidade.

Voltando ao ponto inicial, que é o que interessa,esse espaço onde estive foi no Hospital Moinhos de Vento, e é especialmente preparado, com muito capricho, para acomodar pacientes mulheres que farão pequenas ou grandes cirurgias. Quando cheguei, observei que havia três mulheres sentadas em confortáveis poltronas, quietas olhando para uma tv que exibia desenho infantil. Logo calculei que a mente delas não estava ali e sim muito longe, talvez apreensivas com a cirurgia. Não sei, mas achei que pairava no ar uma velada preocupação e senti vontade de mudar aquilo, transformar a espera em algo mais leve, divertido e produtivo para todas nós. Resolvi puxar conversa com a mais moça das mulheres e foi o que bastou para que todas as outras falassem sem parar e o ambiente se tornasse uma sala de bate papo. A senhora mais velha abriu os olhos, que até então estavam fechados, e o semblante preocupado foi substituído pela alegria de livrar-se daquele silêncio. Ela contou que morava sozinha e tinha quatro filhos, mas um havia falecido muito jovem num acidente de carro e que os outros três moravam em cidades diferentes, porém naquele momento tinha um lhe acompanhando. Disse que tinha dormido mal por causa da sua cirurgia e que queria muito ter uma recuperação fácil, porque não contava com ninguém para cuidá-la. A moça mais jovem perguntou se ela não tinha noras, ao que respondeu de sopetão: ”as noras de hoje em dia, não duram o tempo suficiente para conhecer a sogra, o que dirá cuidá-las”. Ela tinha feito um desabafo da solidão que sentia. A outra moça concluiu que era um problema ter só filhos homens. Disse que tinha um filhinho de dois anos e queria muito ter  mais duas meninas para ser cuidada na velhice. Essa frase trouxe á minha lembrança o meu pai e do orgulho que tem em ter cinco filhas mulheres. Lembrei de quando alguém dizia que filha mulher era gasto dobrado e ele respondia que ”vale o investimento, pois serei cinco vezes mais bem cuidado na minha velhice”. 

Uma das moças é de Santa Catarina e perguntei se conhecia Porto Alegre, e ela disse que só o aeroporto, o Hospital Moinhos de Vento e o Hotel que ficava quando vinha para a capital.Foram  três cirurgias e ela fez um relato impressionante dos últimos quatro anos, desde quando descobriu um problema no quadril que causava fortes dores e a impedia de caminhar. Ela tinha falado que era professora de educação física, então, não podia mais dar aulas de ginástica.Me dei conta e fiquei imaginando o custo emocional que deve ser para uma pessoa abdicar da sua profissão.Olhei para aquele rosto muito jovem e vi que havia no olhar o brilho da esperança da conquista da cura naquela cirurgia que se aproximava. Ela queria ter uma vida normal, caminhar e engravidar. Tão pouco era muito para aquela jovem. Falou que, de tudo, o que mais a incomodava era usar muletas logo após as cirurgias. Fez planos e contagiou a todas nós.Pensei na minha filha Juliana, que tem a mesma idade dessa moça, na sua felicidade por ser mãe da Martina e na sua realização profissional com a carreira de Procuradora da União. Recordei da minha nora Fernanda e sua satisfação em cuidar da Marcela recém nascida. Agradeci a Deus por isso.

Falávamos que nem umas matracas quando apontou na porta a enfermeira para buscar a moça de Santa Catarina.Tinha chegado a hora da cirurgia dela e seria longa, depois, quase um dia na recuperação, mais outros no quarto e finalmente viajaria de volta para a sua cidade. Desejei mais que sucesso na cirurgia dela, falei que tinha sido muito bom conhecê-la, que jamais esqueceria a bravura dela. Às 12h, eu já estava em casa com um pequeno curativo que nem aparecia e lembrei que a jovem catarinense teria que sair do hospital de muletas. Durante a tarde trabalhei normalmente, mas confesso que aquelas horas na sala de espera do bloco cirúrgico mexeram demais comigo e não saíam do meu pensamento.O que ficou para mim é que somos pequenos diante da grandeza da vida e nessa circunstâncias, todos são iguais, não existe distinção alguma. Medos e sonhos, balanços e reflexões são sentimentos que predominam e são compartilhados nesse momento de espera e expectativa. Escutei relatos de vida de pessoas que eram estranhas, que ali se tornaram próximas e agora me pego pensando nelas, torcendo por cada uma delas. Há pouco liguei para o Hospital Moinhos de Vento em busca de notícias e fiquei feliz ao saber que todas estão bem.

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